SALMO 𝟚

Beijai o Filho, para que não se ire, e pereçais no caminho; porque em breve se inflamará a sua ira.

Bem-aventurados todos aqueles que nele confiam.





ORAÇÃO ⁜ SALMO DA BÍBLIA № 2


§ 2:1  Por que se amotinam as nações, e os povos tramam em vão?

§ 2:2  Os reis da terra se levantam, e os príncipes juntos conspiram contra o Senhor e contra o seu ungido, dizendo:

§ 2:3  Rompamos as suas ataduras, e sacudamos de nós as suas cordas.

§ 2:4  Aquele que está sentado nos céus se rirá; o Senhor zombará deles.

§ 2:5  Então lhes falará na sua ira, e no seu furor os confundirá, dizendo:

§ 2:6  Eu tenho estabelecido o meu Rei sobre Sião, meu santo monte.

§ 2:7  Ƒ Falarei do decreto do Senhor; ele me disse: Tu és meu Filho, hoje te gerei.

§ 2:8  Pede-me, e eu te darei as nações por herança, e as extremidades da terra por possessão.

§ 2:9  Ŧ Tu os quebrarás com uma vara de ferro; tu os despedaçarás como a um vaso de oleiro.

§ 2:10  Agora, pois, ó reis, sede prudentes; deixai-vos instruir, juízes da terra.

§ 2:11  Servi ao Senhor com temor, e regozijai-vos com tremor.

§ 2:12  Beijai o Filho, para que não se ire, e pereçais no caminho; porque em breve se inflamará a sua ira. Bem-aventurados todos aqueles que nele confiam.


O SALMO 2



§ 1
1.2 “Por que as nações se agitaram e os povos tramaram em vão? Os reis da terra se sublevaram e os príncipes unidos conspiraram contra o Senhor e o seu Cristo”.

Por que” em vez de “em vão”.

Pois, eles não conseguiram realizar o intento de pôr termo à vida de Cristo. Trata-se dos perseguidores do Senhor, citados também nos Atos dos Apóstolos (At 4,26).



§ 2
3 “Quebremos suas cadeias e sacudamos o seu jugo”.

Embora possa ter outro sentido, aplica-se melhor às pessoas das quais se disse que tramaram em vão.

Quebremos suas cadeias e sacudamos o seu jugo”.

Cuidemos de que a religião cristã não nos prenda nem nos seja imposta.



§ 3
4 “Rir-se-á deles o que habita nos céus. Deles zombará o Senhor”.

É repetição. Ao invés de dizer “o que habita nos céus”, da segunda vez encontra-se “o Senhor”.

Em lugar de “rir-se-á” temos “zombará”.

Não se tomem carnalmente essas expressões, como se Deus se risse, ou zombasse, torcendo a boca ou o nariz. Mas, hão de ser entendidas no sentido da força concedida por Deus a seus santos. Estes, olhando o futuro, isto é, o nome de Cristo e o seu domínio estendido aos vindouros e alcançando todas as gentes, compreendam que aqueles tramaram em vão. Tal capacidade de previsão constitui a irrisão e zombaria da parte de Deus.

Rir-se-á deles o que habita nos céus”.

Se os céus são as almas santas, por meio delas, Deus, que conhece o futuro, rir-se-á e zombará deles.



§ 4
5 “Então há de ameaçá-los em sua ira, aterrorizá-los em seu furor”.

Mostrando mais claramente como lhes falará, declarou:

Aterrorizá-los-á”, de modo que “sua ira” seja idêntica a “seu furor”.

Ira e furor do Senhor não são perturbação da mente e sim força vindicativa, inteiramente justa, pois serve-o submissa toda a criação. Principalmente se considere e mantenha o que consta nos escritos de Salomão:

Senhor poderoso, julgas com tranquilidade, e tudo dispões com grande indulgência(Sb 12,18).

A ira de Deus, portanto, é a comoção da alma, conhecedora da lei de Deus, ao ver o pecador transgredir a mesma lei. Grande é a reivindicação desta comoção das almas justas. Ainda é possível entender a ira de Deus como o próprio obscurecimento da mente dos transgressores da lei de Deus.



§ 5
6 “Eu, porém, fui por ele constituído rei em Sião, sua montanha santa, para pregar o mandamento do Senhor”.

Trata-se, evidentemente, da pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo. Se conforme a opinião de alguns a palavra Sião significa contemplação, a nada mais devemos aplicá-la do que à Igreja, onde cotidianamente a atenção do espírito se eleva à contemplação da glória de Deus, segundo diz o Apóstolo:

E nós todos que, com a face descoberta, contemplamos a glória do Senhor(2 Cor 3,18).

O sentido é, portanto, o seguinte: Eu, porém, fui por ele constituído rei de sua santa Igreja, denominada monte, devido à elevação e à firmeza.

Fui por ele constituído rei”, eu cujas cadeias eles pretendiam quebrar e cujo jugo queriam sacudir.

Para pregar o mandamento do Senhor”.

Quem não o percebe, se isto continuamente acontece?



§ 6
7 “Disse-me o Senhor: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei”.

Embora pareça a profecia referir-se ao dia do nascimento de Jesus, enquanto homem, no entanto, têm sentido divino as palavras: Eu hoje te gerei, pois “hoje” significa o presente e na eternidade não há passado, como se algo ainda não existisse, mas apenas no presente, porque aquilo que é eterno existe sempre. Por isso, a autêntica fé católica prega a geração eterna do poder e da sabedoria de Deus, que é o Filho unigênito.



§ 7
8 “Pede-me e dar-te-ei as nações por herança”.

Isto já no tempo lhe acontece, enquanto homem, que se ofereceu em sacrifício, como substituição de todos os sacrifícios, e que também intercede por nós (Rm 8,34).

Assim a palavra pede-me refere-se a toda a economia temporal, realizada em prol do gênero humano, a saber, que as nações se unam sob o nome de cristãs e por conseguinte sejam redimidas da morte e possuídas por Deus.

Dar-te-ei as nações por herança”, e possuí-las-ás para a salvação delas e colherás frutos espirituais.

E como propriedade os confins da terra”.

Repete-se. Confins da terra em vez de nações: mas, com maior clareza, para entendermos todas as nações. A propriedade, porém, chama-se acima herança.



§ 8
9.10 “Hás de governá-las com cetro de ferro”, com justiça inflexível.

E esmigalhá-las qual vaso de argila”, isto é, esmagarás as ambições terrenas, as preocupações lamacentas do velho homem, tudo o que do limo do pecado foi contraído e implantado.

Agora, ó reis, entendei”.

Agora, quer dizer, já renovados, já estraçalhados os revestimentos de barro, isto é, os recipientes carnais do erro, pertencentes à vida passada. Agora entendei. Já sois reis, capazes de reger tudo o que em vós existe de servil e animal, e aptos para a luta, mas não como quem fere o ar, e sim tratando duramente os vossos corpos e reduzindo-os à servidão (1 Cor 9,26.27).

Instruí-vos, ó juízes da terra”.

Nova repetição:

Instruí-vos” em lugar de “entendei”; “ó juízes da terra” em vez de “ó reis”.

A expressão juízes da terra significa os espirituais. Julgamos o inferior a nós e tudo o que está abaixo do homem espiritual denomina-se, com razão, terra, porque atingido pela nódoa terrena.



§ 9
11 “Servi ao Senhor com temor”, a fim de não se transformar em soberba a interpelação: reis, juízes da terra.

E exultai diante dele com temor”.

É ótimo o acréscimo: exultai, para não parecer equivalente a infelicidade a frase:

Servi ao Senhor com temor”.

De outro lado, evitando uma efusão temerária, acrescentou o salmista, “com temor”, como precaução e guarda circunspecta da santificação. É ainda possível o sentido seguinte:

Agora, ó reis, entendei”, a saber, agora que fui constituído rei, não vos entristeçais, ó reis da terra, como se vos tivesse sido arrebatado um bem próprio. Ao contrário, entendei e instruí-vos. Ser-vos-á proveitosa a sujeição àquele que vos dá entendimento e instrução. Não vos convém dominar temerariamente; mas servi ao Senhor de todos com temor, e exultai por causa da bem-aventurança segura e genuína, precavidos e bem avisados, para de lá não cairdes pela soberba.



§ 10
12 “Abraçai a disciplina, para não se irritar o Senhor e não perecerdes no caminho da justiça”.

É o mesmo que acima:

entendei e instruí-vos”.

Entender e ser instruído é igual a abraçar a disciplina. No entanto, a locução “abraçai” bem indica certo refúgio e defesa contra tudo o que poderia causar dano, se não se abraçasse com grande cuidado.

Para não se irritar o Senhor” foi dito condicionalmente; não quanto à visão do profeta, que é segura, mas relativamente àqueles que são admoestados; pois se costuma duvidar da ira de Deus quando não claramente revelada. Deviam eles dizer a si mesmos: Abracemos a disciplina para não se irritar o Senhor e não perecermos no caminho da justiça. Acima foi exposto como tomar a expressão:

Não se irritar o Senhor. E não perecerdes no caminho da justiça”.

Eis o grande castigo, temido por aqueles que prelibaram a doçura da justiça. Quem se desvia do caminho da justiça, há de vagar na maior miséria pelas sendas da iniquidade.



§ 11
13 “Quando em breve se inflamar a sua cólera, felizes todos os que nele confiam”, isto é, quando vier o castigo preparado para os ímpios e pecadores, não atingirá os que confiam no Senhor e ainda lhes será de grande utilidade, instruindo-os e exaltando-os em vista do reino. Não afirmou:

Quando em breve se inflamar a sua cólera, estarão em segurança todos os que nele confiam”, como se dissesse apenas que não serão punidos, mas denominou-os felizes. Representa isso o resumo e o cúmulo de todos os bens. A meu ver, em breve, significa algo de repentino, que advirá enquanto os pecadores estiverem pensando que será remoto e em futuro longínquo.