SALMO 𝟭

Elevo os meus olhos para os montes; de onde me vem o socorro?

O meu socorro vem do Senhor, que fez os céus e a terra.





ORAÇÃO ⁜ SALMO DA BÍBLIA № 121


§ 121:1  Elevo os meus olhos para os montes; de onde me vem o socorro?

§ 121:2  O meu socorro vem do Senhor, que fez os céus e a terra.

§ 121:3  Ɲ Não deixará vacilar o teu pé; aquele que te guarda não dormitará.

§ 121:4  Eis que não dormitará nem dormirá aquele que guarda a Israel.

§ 121:5  O Senhor é quem te guarda; o Senhor é a tua sombra à tua mão direita.

§ 121:6  Ɗ De dia o sol não te ferirá, nem a lua de noite.

§ 121:7  O Senhor te guardará de todo o mal; ele guardará a tua vida.

§ 121:8  O Senhor guardará a tua saída e a tua entrada, desde agora e para sempre.


O SALMO 121



SERMÃO AO POVO 💬

§ 1
Assim como o amor impuro inflama a alma e convida a desejar bens terrenos e buscar coisas perecíveis, fazendo-a perecer, precipitando-a nas profundezas e mergulhando-a no abismo, do mesmo modo o amor santo eleva para as alturas, traz ardente desejo das coisas eternas, e excita a alma no anelo pelos bens que não passam nem morrem, erguendo-a das regiões inferiores ao céu. De fato, todo amor tem a sua própria força, e não pode estar ocioso na alma do que ama; necessariamente há de impelir. Queres saber qual a espécie de um amor determinado? Considera aonde ele conduz. Não vos exortamos, pois, a não amar coisa alguma, mas vos exortamos a não amardes o mundo a fim de amardes livremente o Criador do mundo. A alma presa ao amor da terra, tem uma espécie de visgo nas asas; não pode voar. Purificada, contudo, dos afetos imundos das coisas desta terra, estende as asas, e com as duas asas livres de qualquer impedimento, isto é, seguindo os dois mandamentos do amor de Deus e do próximo (cf Mt 22,40), pode voar. Para onde, a não ser subindo pelo vôo até Deus, porque sobe pelo amor? Antes de lhe ser isto possível, geme sobre a terra. Se já tem dentro de si o desejo de voar, e diz:

Quem me dará asas como as da pomba para voar e repousar”? (Sl 54,7).

Para onde haverá de voar? De onde senão do meio dos escândalos, entre os quais gemia também este homem, cuja voz relembrei? Por conseguinte, do meio dos escândalos, da companhia dos maus, das palhas misturadas aos grãos, ele quer voar para um local onde não sofra da união e sociedade dos iníquos, mas viva na santa sociedade dos anjos, cidadãos da eterna Jerusalém.



§ 2
1 Com efeito, este salmo, que hoje empreendemos comentar para V. Santidade, trata do desejo de Jerusalém; ou antes, é o salmista que sobe com este salmo, que na verdade é “Cântico gradual”.

Conforme dissemos várias vezes a V. Caridade, não são degraus para descer, mas para subir 1. O salmista, portanto, quer subir. E para onde quer subir, a não ser para o céu? Por que para o céu? Será que quer subir para ficar entre o sol, a lua e as estrelas? De forma alguma. Mas refere-se ao céu da eterna Jerusalém, onde estão nossos concidadãos, os anjos. Da companhia destes nossos concidadãos estamos longe, peregrinando sobre a terra. Em nossa peregrinação suspiramos; em nossa cidade alegrar-nos-emos. Encontramos, porém, nesta peregrinação companheiros que já viram a cidade e convidam-nos a corrermos para ela. Com isso rejubila-se o salmista e diz:

Alegrei-me com o que me foi dito: Iremos à casa do Senhor”.

Irmãos, rememore V. Caridade que se, acaso, se fala de festa de mártires ou de algum lugar santo, para onde afluem as multidões em determinada data para celebrar a solenidade, como aquelas multidões animam-se mutuamente, como se estimulam, dizendo: Vamos, vamos. E perguntam: Aonde iremos? Responde-se: Àquele lugar, ao lugar santo. Falam entre si, e como que inflamados, um por um, tornam-se uma chama só; e esta única chama, acesa por seus mútuos convites, arrasta-os ao lugar santo, e os santos pensamentos os santificam. Se, portanto, um santo amor arrasta a um lugar material, qual não deve ser o amor que arrebata ao céu os que estão em concórdia, e dizem-se uns aos outros:

Iremos à casa do Senhor?” Por conseguinte, corramos, corramos, porque vamos à casa do Senhor. Corramos sem nos fatigarmos; pois alcançaremos o local onde não mais nos cansaremos. Corramos para a casa do Senhor, e alegre-se nossa alma com o que nos foi dito. Os que nos falam, viram a pátria antes de nós, e de longe gritam para os que vêm atrás:

Iremos à casa do Senhor”: andai, correi. Os apóstolos a viram e nos disseram: Correi, andai, prossegui, “iremos à casa do Senhor”.

E que responde cada um de nós? “Alegrei-me com o que me foi dito: Iremos à casa do Senhor”.

Alegrei-me com os profetas, alegrei-me com os apóstolos. Pois, todos eles nos disseram:

Iremos à casa do Senhor”.



§ 3
2 “Detiveram-se nossos pés em teus átrios, ó Jerusalém”.

Aqui tens a casa do Senhor, se procuravas saber o que é a casa do Senhor. Naquela casa do Senhor se louva aquele que a construiu. Ele constitui as delícias de todos os que habitam nessa casa; ele é a única esperança aqui, e a realidade ali. Por conseguinte, os que correm em que devem pensar? Que estão quase ali, e lá se detêm. É coisa grandiosa, de fato, estar ali entre os anjos e não desistir. Aquele que de lá caiu, não permaneceu na verdade (cf Jo 8,44).

Todos os que não cairam, permanecem na verdade; permanece aquele que goza da presença de Deus. Aquele que quiser, porém, gozar de si mesmo, cai. Quem é que procura fruir de si mesmo? Quem é soberbo. Por isso, aquele que sempre queria estar nos átrios de Jerusalém, dizia:

Na tua luz contemplamos a luz”; não: em minha luz. E:

Pois em ti está a fonte da vida”; não: em mim. E que acrescenta ainda? “Não me pisoteie a soberba, nem as mãos dos pecadores me sacudam(Sl 35,10.12).

Tombaram os obreiros de iniqüidade. Foram expulsos e não puderam manter-se em pé(Sl 35,13).

Se, portanto, eles não puderam permanecer, porque foram soberbos, sobe humildemente, a fim de dizeres:

Detiveram-se os nossos pés em teus átrios, ó Jerusalém”.

Pensa o que serás ali; e embora estejas ainda a caminho, coloca diante de teus olhos a idéia de que de certo modo ali estás, quase já te alegras sem cessar entre os anjos, e te sucederá o que foi dito:

Felizes os que habitam em tua casa. Louvar-te-ão pelos séculos dos séculos(Sl 83,5).

Detiveram-se os nossos pés em teus átrios, ó Jerusalém”.

De que Jerusalém? Costuma-se chamar Jerusalém também a terrena. Mas, esta Jerusalém é apenas uma sombra da outra. E que importância há em estar nesta Jerusalém, se ela não pôde se manter, mas converteu-se em ruínas? O Espírito Santo se referirá a ela, como algo de grande, ao falar através do coração ardente de quem ama:

Detiveram-se os nossos pés em teus átrios, ó Jerusalém?” Não seria esta a Jerusalém, à qual o Senhor apostrofou:

Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te são enviados”? (Mt 23,37).

Que desejava de importante o salmista, se queria estar entre os que matavam os profetas e apedrejavam os que lhes eram enviados? De forma alguma pense isto de Jerusalém aquele que ama, que arde de desejo, que ambiciona chegar a Jerusalém que é nossa mãe, da qual diz o Apóstolo:

eterna nos céus(cf Gl 4,26; 2Cor 5,1).



§ 4
3 Enfim, escuta; não é em mim que deves acreditar. Escuta como continua o salmo e qual a Jerusalém que designa a nosso entendimento. Tendo dito:

Detiveram-se os nossos pés em teus átrios, ó Jerusalém”, como se ouvisse a pergunta: De que Jerusalém estás falando? A que Jerusalém fazes referência? logo acrescenta:

Jerusalém, construída como uma cidade”.

Irmãos, quando Davi assim falava, aquela cidade estava terminada, não estava sendo construída. Não sei a que cidade, portanto, se refere, que está sendo edificada agora, e para a qual acorrem na fé as pedras vivas, mencionadas por Pedro:

Também vós, como pedras vivas, constituí-vos em um edifício espiritual(1Pd 2,5), isto é, em templo santo de Deus. Que quer dizer:

como pedras vivas constituí-vos em um edifício espiritual”? Pedras vivas, se acreditas; se acreditas, tornar-te-ás templo de Deus, conforme afirma o apóstolo Paulo:

Pois o templo de Deus é santo e esse templo sois vós(1 Cor 3,17).

Agora, portanto, edifica-se a cidade; cortam-se as pedras dos montes pelas mãos dos que anunciam a verdade, e são esquadriadas para entrarem na es-trutura eterna. Ainda estão muitas pedras nas mãos do artífice; não caiam de suas mãos, para poderem perfeitamente se adaptar à estrutura do templo. Trata-se, pois, desta “Jerusalém, construída como cidade”.

Seu fundamento é Cristo. Assegura o apóstolo Paulo:

Quanto ao fundamento, ninguém pode colocar outro diverso do que foi posto: Cristo Jesus(1 Cor 3,11).

Quando se lança o fundamento na terra, levantam-se sobre ele as paredes e o peso das paredes puxa para baixo, onde se encontra a base. Se, porém, nosso fundamento está no céu, para lá se ergue o edifício. Seres humanos edificaram esta estrutura, esta basílica, que vedes como se levantou bem ampla; foram homens que a construíram, e lançaram os alicerces na terra. Como, ao contrário, o edifício de que fazemos parte é espiritual, nossos alicerces estão no alto. Para lá, portanto, corramos, lá devemos ser edificados, porque foi dito de Jerusalém:

Detiveram-se os nossos pés em teus átrios, ó Jerusalém”.

Mas, de qual Jerusalém? Da “Jerusalém, construída como uma cidade”.

Ainda é pouco para determinar qual Jerusalém dizer:

construída como uma cidade”, porque ainda se pode designar assim a terrena. Mas, pode-se apresentar alguém que declare: Na verdade, quando isso se dizia no tempo de Davi, e assim se cantava, a cidade estava terminada; mas Davi em espírito via que seria arruinada e reedificada. Pois, a cidade foi tomada e o povo cativo foi transportado para Babilônia, e a Escritura denomina o acontecimento pelo termo de cativeiro de Babilônia. E o profeta Jeremias prenunciou que depois de setenta anos de cativeiro, a cidade que fora destruída pelos vencedores poderia ser reedificada. Talvez replique alguém: Davi previa em espírito que a cidade seria arruinada pelos vencedores, e Jerusalém novamente poderia ser edificada, depois de setenta anos, e por isso disse:

Jerusalém, construída como uma cidade”; mas não se julgue que se refira àquela cidade que consta de santos, quais pedras vivas. Como continua o salmo, a fim de resolver toda dúvida? “Detiveram-se os nossos pés em teus átrios, Jerusalém”.

Mas qual é a Jerusalém que designo? Acaso esta que vedes erguida, com paredes materiais? Não; mas a “Jerusalém, construída como uma cidade”.

Por que não se fala claramente de cidade e sim:

como uma cidade?” A não ser que esta estrutura de paredes, que havia em Jerusalém, constituía uma cidade visível, como propriamente se diz de todas as cidades. Aquela, porém, é construída como uma cidade, porque os que a compõem, são “como que pedras vivas”.

Então não são verdadeiras pedras? Como os elementos são como pedras, e não simplesmente pedras, assim não se fala somente de cidade, mas “como uma cidade”, da qual disse o salmista que “é construída”.

Indica sob o nome de edifício a estrutura e construção de elementos materiais e de paredes. Pois, propriamente se entende por cidade os seus habitantes. Mas ele nos manifestou que cidade aqui designa a urbe, porque “se constrói”.

E como um edifício espiritual se assemelha a um edifício material, é “construída como uma cidade”.



§ 5
Mas que ele prossiga e nos tire todas as dúvidas de que não devemos tomar materialmente as palavras:

Jerusalém, construída como uma cidade que participa em idipsum”.

Agora, irmãos, qualquer que eleve o espírito, que deponha a escuridão da carne, que limpe os olhos do coração, levante-se e veja o que é idipsum. Que significa idipsum? Que direi a não ser idipsum? Irmãos, se for possível, entendei o que é idipsum. Pois, seja o que for que eu disser, não exprimo o que é idipsum. Esforcemo-nos, contudo, por comparação com palavras e sentido aproximados, levar a fraqueza de nossa mente a pensar no que seria idipsum. Que é idipsum? Aquilo que é sempre da mesma maneira; o que não é ora uma coisa, ora outra. Que significa idipsum senão o que é? E que seria o que é? O que é eterno. Pois, aquilo que sempre se torna diferente, não é, porque não permanece; não deixa de ser de modo absoluto, mas não é por excelência. E que é aquilo que é, a não ser aquele que ao enviar Moisés, lhe disse:

Eu sou aquele que é?” Quem, senão aquele que (tendo dito o seu servo: Eis que me envias. Se o povo me perguntar:

Qual é o seu nome? Que direi?”) não quis dar outro nome a não ser:

Eu sou aquele que é”, e acrescentou:

Assim dirás aos filhos de Israel: eu sou me enviou até vós(Ex 3,13.14).

Eis o que significa idipsum: Eu sou aquele que é. Eu sou me enviou até vós”.

Não podes captar; é demais para se entender, demais para se apreender. Retém aquilo que se tornou por ti aquele que não podes captar. Retém a carne de Cristo, que te carregou quando estavas doente, meio morto devido às feridas infligidas pelos ladrões, e levou à hospedaria para seres tratado (cf Lc 10,30).

Conseqüentemente, corramos para a casa do Senhor, e alcancemos a cidade onde se detenham os nossos pés; cidade “construída como uma cidade”, que participa em idipsum. O que deves reter? Aquilo que Cristo se fez por tua causa, pois se trata de Cristo mesmo. A Cristo com razão se atribui a palavra:

Eu sou aquele que é”, na condição divina. Nela não se prevaleceu de sua igualdade com Deus (cf Fl 2,6), isto é, em idipsum. Para que tu te tornasses participante do que ele é em si, primeiro ele se fez partícipe do que é teu. O Verbo se fez carne para que a carne participe do Verbo (cf Jo 1,14).

Sendo da descendência de Abraão, o Verbo se fez carne e habitou entre nós; fora prometido, de fato, a Abraão e a Isaac e a Jacó que em sua descendência seriam abençoadas todas as nações (cf Gn 22,18).

Por isso, vemos a Igreja difundida em todo o orbe. Deus fala a homens fracos. Ele procurou firmeza de coração, ao dizer:

Eu sou aquele que é”; procurou firmeza de coração e a mais alta contemplação, ao dizer:

Eu sou me enviou até vós”.

Mas talvez ainda não chegaste à contemplação. Não desanimes, não desesperes. Aquele que é, quis ser homem como tu, e por isso em seguida disse a Moisés, um tanto atemorizado, o seu nome. Que nome? O que significa:

É”? E disse o Senhor a Moisés:

Eu sou o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó. Este é o meu nome para sempre(Ex 3,15).

Não percas a coragem porque eu disse:

Eu sou aquele que é” e:

Eu sou me enviou até vós”, porque agora tu flutuas, e não podes perceber, devido à mutabilidade dos seres e às vicissitudes da mortalidade humana o que significa idipsum. Eu desço, porque não podes vir até mim.

Eu sou o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó”.

Espera algo da descendência de Abraão, a fim de te fortificares e contemplares aquele que veio a ti, sendo da descendência de Abraão.



§ 6
Portanto, trata-se de idipsum, do qual foi dito:

Mudá- las-ás e se transformarão. Mas tu és sempre o mesmo e teus anos não terminarão(Sl 101,27-28).

Eis o mesmo (idipsum), cujos “anos não terminarão”.

Irmãos, os nossos anos não passam cada dia, nem param, absolutamente? Pois, os que vieram já não existem; e os que hão de vir ainda não são; aqueles já passaram, e passarão os que hão de vir. Mesmo neste único dia de hoje, irmãos, agora enquanto falamos é um momento só. As horas anteriores passaram, as futuras ainda não vieram; e quando vierem, elas também passarão e terminarão. Quais são os anos que não terminam senão os que permanecem? Se, portanto, ali os anos permanecem, os anos que permanecem constituem um só ano, e este único ano que permanece constitui um só dia. Este único dia não tem começo nem fim, não se inicia ontem, nem termina com o amanhã, mas permanece sempre como um só dia; e à vontade o denominas dia, ou ano, ou se preferes é um só dia; seja o que for que cogitares, permanece no entanto; sua estabilidade participa aquela cidade “que participa em idipsum”.

Com razão, portanto, uma vez que a cidade participa desta estabilidade, diz aquele que corre para lá:

Detiveram-se os nossos pés em teus átrios, ó Jerusalém”.

Pois, permanecem todas as coisas lá onde nada passa. Queres também tu permanecer e não passar? Corre para lá. Ninguém por si mesmo possui o idipsum. Atenção, irmãos. Tudo o que tem corpo, não é idipsum, porque não permanece em si mesmo. Muda pela idade, muda pela transferência de lugar e de tempo, muda pelas doenças e defeitos carnais; portanto, não permanece em si mesmo. Os corpos celestes não permanecem em si mesmos; sofrem certas mutações, embora ocultas; certamente mudam de lugar em lugar, sobem do oriente ao ocidente e de novo voltam ao oriente; portanto, não permanecem, não são idipsum. Nem mesmo a alma humana permanece. Por quantas mutações e cogitações ela varia! por quantos prazeres muda! por quantos desejos é atingida e dividida! A própria mente humana, que é chamada racional, é mutável, não é idipsum. Ora quer, ora não quer; ora sabe, ora desconhece; ora se lembra, ora se esquece; portanto ninguém tem por si mesmo idipsum. Aquele que quis ter por si mesmo idipsum, como se fosse por si mesmo idipsum, caiu; decaiu o anjo, e tornou-se diabo. Ofereceu de beber ao homem a soberba (cf Gn 3,1), arrastou consigo pela inveja aquele que estava de pé. Eles quiseram ser idipsum; quiseram ser príncipes, quiseram dominar; não quiseram ter o verdadeiro Senhor, que verdadeiro é idipsum e ao qual foi dito:

Muda-las-ás e se transformarão. Mas tu és sempre o mesmo(Sl 101,27.28).

Volte, portanto, a idipsum a alma humilhada, depois de tanta enfermidade, depois de tantas doenças, dificuldades, labores; e fique naquela cidade, “que participa em idipsum.



§ 7
4 “Para lá subiram as tribos”.

Interroguemos, pois, para onde subir aquele que caiu; porque dissemos que esta voz é de alguém que sobe, da Igreja que sobe. Para onde imaginamos que ela sobe? Para onde vai? Para onde se eleva? “Para lá subiram as tribos”.

Para onde subiram as tribos? Para a cidade, “que participa em idipsum”.

Por conseguinte, sobem para lá, para Jerusalém. Um homem, porém, que descia de Jerusalém a Jericó, caiu no meio de assaltantes (cf Lc 10,30).

Não descesse, e não cairia no poder de ladrões. Aquele, porém, que descendo caiu no poder de ladrões, subindo venha à companhia dos anjos. Suba, portanto, porque as tribos subiram. Mas quais são as tribos? Muitos sabem e muitos não sabem. Mas também nós que sabemos, desçamos para junto daqueles que não conhecem as tribos, a fim de que conosco subam para lá aonde subiram as tribos. As tribos podem receber outro nome, o de cúrias, mas não com propriedade. Portanto, as tribos com outro nome não podem ser chamadas propriamente; mas um nome aproximado seria cúria. Pois, propriamente se dissermos cúria, só se entende a cúria que existe em cada cidade; daí vem que são chamados curiais e decuriões os que estão na cúria ou decúria; e sabeis que cada uma das cidades possui tais cúrias, uma por cidade. Existem, contudo, ou existiam outrora nestas cidades também as cúrias do povo; e uma cidade tem muitas cúrias, como Roma, que tem trinta e cinco cúrias do povo. Elas se chamam tribos. Destas, o povo de Israel tinha doze, de acordo com o número dos filhos de Jacó.



§ 8
O povo de Israel tinha doze tribos; nelas existiam bons e maus. Quais as tribos más que crucificaram o Senhor? Quais as tribos boas que reconheceram o Senhor? Por conseguinte, as tribos que crucificaram o Senhor são tribos do diabo. Por conseguinte, quando o salmista aqui disse:

Para lá subiram as tribos”, para não entenderes que fala de todas as tribos, acrescentou:

as tribos do Senhor”.

Que significa:

as tribos do Senhor?” As que conheceram o Senhor. Entre elas, pois, as doze tribos más, havia bons das tribos boas, que reconheceram o construtor da cidade; e no meio daquelas tribos, eram grãos misturados às palhas. Subiram, porém, não com as palhas, mas como tribos purificadas, escolhidas, tribos do Senhor.

Para lá subiram as tribos, as tribos do Senhor”.

Que significa:

tribos do Senhor? Como testemunho de Israel”.

Ouvi, irmãos, o que quer dizer:

Testemunho de Israel”, isto é, como se conhece que se trata de verdadeiro Israel. Pois, que quer dizer Israel? Já disse qual a interpretação do nome, e seja repetida várias vezes; talvez, mesmo se disse recentemente, esquecestes. Repetindo-o, façamos com que não se esqueçam mesmo os que não sabem ou não querem ler; sejamos nós livro para eles. Israel se traduz por aquele que vê a Deus; ou antes, se melhor examinarmos a palavra, assim se traduz Israel: é, aquele que vê a Deus. Ambas as coisas: é, aquele que vê a Deus. Porque em si o homem não é; pois muda e converte-se noutra coisa, se não participar daquele que é em si mesmo (idipsum).

Começa a ser quando vê a Deus. É, quando vê aquele que é; e vendo aquele que é, ele também a seu modo vem a ser. Portanto ele é Israel, e Israel é aquele que vê a Deus. Por isso, o soberbo não é Israel, porque não participa daquele que é idipsum, pois quer ser para si mesmo idipsum. Quem quer ser seu próprio princípio não é Is-rael. Conseqüentemente, todo homem fingido não é Israel, porque todo soberbo necessariamente é fingido. Afirmo-o, irmãos, necessariamente todo soberbo quer parecer aquilo que não é; não pode ser de outro modo, meus irmãos. Oxalá quisesse o soberbo parecer o que não é, de tal sorte que quisesse, por exemplo, parecer flautista quando não é flautista. Logo provaria que não o é. Se alguém lhe disesse: Toca, vejamos se és flautista. Não poderia; logo se descobriria que falsamente queria parecer o que não era. Se ele afirmasse que é eloqüente, poder-se-ia pedir-lhe: Fala, prova-o. Se falasse, descobrir-se-ia que não era o que assegurara ser. O soberbo, o que é pior, quer parecer justo quando não é; e como é difícil averiguar se há justiça, é difícil reconhecer os soberbos. Portanto, querem os soberbos parecer o que não são; por isso, sua parte não é com “idipsum”; não pertencem a Israel, que é aquele que vê a Deus. Quem, pois, pertence a Israel? Quem participa em “idipsum”.

Quem é que participa em “idipsum”? Quem confessa que não é o que Deus é, e que dele recebeu o bem que pode ter, que por si só possui o pecado, e de Deus lhe vem a justiça. Tal homem não tem dolo em si. E que disse o Senhor, ao ver Natanael? “Eis um verdadeiro israelita, em quem não há fingimento(Jo 1,47).

Se, portanto, é verdadeiro israelita aquele em quem não há fingimento, sobem a Jerusalém as tribos nas quais não há fingimento. E elas são “testemunho de Israel”, isto é, por meio delas se reconhece que os grãos estavam no meio da palha (cf Mt 3,12), quando a eira parecia toda cheia de palha. Os grãos, pois, estavam ali; mas ao subirem à sublimidade do esplendor, quando se ventilar a eira, então, haverá “testemunho de Israel”.

Então dirão os maus: Na verdade havia justos entre os maus, quando todos nos pareciam maus; pensávamos que todos eram tais quais nós éramos.

Testemunho de Israel”.

Para onde sobem? Por que sobem? “Para confessar teu nome, ó Senhor”.

Não se pode exprimir de maneira mais magnífica. Como a soberba presume, a humildade confessa. Como é presunçoso quem quer parecer o que não é, assim é confessor quem não quer parecer o que é, e ama o que Deus é. Para isso, portanto, sobem os israelitas, nos quais não há fingimento, porque verdadeiramente são israelitas, porque neles há testemunho de Israel; para isso sobem, “para confessar teu nome, ó Senhor”.



§ 9
5 Lá se assentaram os tronos de justiça (sederunt sedes).

Grande enigma, admirável questão, se não for entendida. Fala-se em assentos que os gregos denominam tronos. Os gregos denominam tronos, os assentos, como sendo lugares de honra. Por conseguinte, meus irmãos, não é de admirar que os homens se sentem em cadeiras, em assentos; mas como entender que os próprios tronos se assentem? Como se alguém dissesse: Assen-tem-se aqui as cátedras, ou assentem-se aqui as cadeiras; pois usam-se a cadeira, as cadeiras, as cátedras como assento, mas os próprios tronos não se assentam. Que significa, portanto: Lá se assentaram os tronos de justiça? Certamente costumais ouvir as palavras de Deus:

O céu é o meu trono, e a terra o escabelo dos meus pés(Is 66,1; At 7,49).

Em latim se diz: O céu é meu assento. Que é isto, senão os justos? Quem são os céus a não ser os justos? Céu é o mesmo que céus, assim como Igreja é o mesmo que Igrejas. São muitas de tal modo que seja uma só. Assim igualmente os justos. Os justos são céu, são céus. Neles Deus põe seu trono, e julga. Não foi sem motivo que se disse:

Narram os céus a glória de Deus(Sl 18,2).

Pois, os apóstolos se tornaram céu. Como se tornaram céu? Porque foram justificados. Da mesma forma que o pecador se tornou terra, e foi-lhe dito:

Pois tu és pó e ao pó tornarás(Gn 3,19), os que foram justificados se tornaram céu. Eram portadores de Deus, e através deles Deus fazia relampejarem milagres, trovejarem terrores, choverem consolações. Eram, portanto, céu, e narravam a glória de Deus. Com efeito, a fim de saberdes que eram denominados céu, diz o salmo:

Seu som repercutiu por toda a terra e em todo o orbe as suas palavras(Sl 18,5).

Perguntas de quem? E descobres que é dos céus. Se, portanto, o céu é o trono de Deus, e os apóstolos são céu, eles se tornaram sedes de Deus, tronos de Deus. Foi dito em outra passagem:

A alma do justo é trono da sabedoria”.

É importante, foi dita uma coisa importante: É trono da sabedoria a alma do justo, isto é, na alma do justo a sabedoria se assenta como em sua cadeira, como em seu trono, e de lá julga cada coisa que julga. Por conseguinte, eles eram tronos de sabedoria, e por isso disse-lhes o Senhor:

Também vós vos sentareis em doze tronos para julgar as doze tribos de Israel(Mt 19,28).

Assim também eles se sentaram em doze tronos, e são tronos de Deus; deles, na verdade, foi dito:

Lá se assentaram os tronos. Porque lá se assentaram os tronos”.

Quais foram os que se assentaram? “Os tronos”.

E que são os tronos? Aqueles dos quais foi dito: A alma do justo é trono da sabedoria. Quais são os tronos? Os céus. Quais são os céus? O céu. Que é o céu? Aquilo mencionado pelo Senhor:

O céu é o meu trono(Is 66,1; At 7,49).

Os justos são tronos e têm tronos; e naquela Jerusalém os tronos se assentarão. Para quê? “Para o juízo. Também vós vos sentareis em doze tronos para julgar as doze tribos de Israel”.

Quais os julgados? Os que estão em baixo, na terra. Quais os juízes? Os que se tornaram céu. Os julgados, porém, serão divididos em duas partes: uma à direita, e outra à esquerda. Os santos julgarão com Cristo.

O Senhor entra em julgamento com os anciãos(Is 3,14), diz Isaías. Uns, portanto, serão os que com ele julgarão; outros que serão julgados por ele e por aqueles que serão juízes com o Senhor. Serão, então, estes divididos em duas partes: uma será colocada à direita, sendo-lhes enumeradas as esmolas que deram; outra estará à esquerda, sendo-lhes citadas a crueldade e a falta de misericórdia. Dir-se-á aos que estiverem à direita:

Vinde, benditos de meu Pai, recebei por herança o reino preparado para vós desde a criação do mundo”.

Por quê? E o Senhor lhes responde:

Pois tive fome e me destes de comer”.

E eles dirão:

Quando foi que te vimos com fome? Ele lhes responderá: Toda vez que o fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes(Mt 25,34).

E então, irmãos? Julgarão os santos aos quais foi dito que adquiram amigos com o dinheiro da iniqüidade, “a fim de que eles os recebam nos tabernáculos eternos(Lc 16,9).

Os santos se sentarão ao lado do Senhor para atender aos que praticaram a misericórdia, separá-los à direita e assumi-los no reino dos céus. Tal é a paz de Jerusalém. Que é a paz de Jerusalém? Consiste em que as obras corporais de misericórdia correspondam às obras espirituais da pregação; far-se-á a paz, dando e recebendo. O Apóstolo afirmou que estas esmolas se acham sob a razão de dar e receber; disse:

Se semeamos em vosso favor os bens espirituais, será excessivo que colhamos os vossos bens materiais”? (1 Cor 9,11).

Sobre o mesmo assunto diz em outra passagem:

Quem recolhera muito, não teve excesso; quem recolhera pouco, não sofreu penúria(2 Cor 8,15).

Por que motivo “quem recolhera muito não teve excesso?” Porque quem possuía mais, deu ao indigente. E que significa:

Quem recolhera pouco, não sofreu penúria?” Porque recebeu daquele que tinha mais, “e assim haverá igualdade(2 Cor 8,14).

De tal paz é que foi dito:

Haja paz em tua fortaleza”.



§ 10
6 Com efeito, tendo dito:

Lá se assentaram os tronos de justiça, os tronos da casa de Davi”, isto é, da família de Cristo, a quem deram no tempo oportuno o alimento, logo disse, como que falando aos próprios tronos:

Interrogai o que trará a paz a Jerusalém”.

Ó tronos, que já vos assentais para julgar, e vos tornastes tronos do Senhor que julga (porque os juízes interrogam e os julgados são interrogados), “interrogai o que trará a paz a Jerusalém”.

Que descobrirão com esta interrogação? Que uns praticaram a misericórdia e outros não. Os que se revelaram misericordiosos serão chamados a Jerusalém. As obras de misericódia trarão “a paz a Jerusalém”.

O amor é forte, meus irmãos; o amor é forte. Queres verificar o quanto é forte? Quem for impedido por motivo de força maior de cumprir o que Deus manda, ame aquele que cumpre seu mandamento e também o cumprirá. V. Caridade preste atenção. Alguém, por exemplo, é casado e não pode abandonar a esposa; importa que obedeça ao Apóstolo:

O marido cumpra o dever conjugal para com a esposa”.

E:

Estás ligado a uma mulher? Não procures romper o vínculo(1 Cor 7,3.27).

Ocorre-lhe a lembrança de que é melhor a vida mencionada pelo mesmo Apóstolo:

Quisera que todos os homens fossem como sou(1 Cor 7,7).

Observa aqueles que assim procedem; ama-os e unido a eles cumpre o que não pode fazer por si mesmo. É forte o amor. É a nossa força. Se não o possuirmos, nada servem as qualidades que possamos ter.

Ainda que eu falasse línguas, as dos homens e as dos anjos, se eu não tivesse a caridade, seria como um bronze que soa ou címbalo que tine”.

Acrescenta uma frase muito importante:

Ainda que eu distribuísse todos os meus bens, ainda que entregasse o meu corpo às chamas, se não tivesse a caridade, isso nada me adiantaria(1 Cor 13,1.3).

Se, contudo, alguém tiver apenas a caridade, se não encontrar o que distribuir aos pobres, ame. Se der somente um copo de água fria (Mt 10,42), ser-lhe-á imputado o mesmo que a Zaqueu, que doou metade de seu patrimônio aos pobres (Lc 19,8).

Por quê? Um deu tão pouco, outro deu tão grande quantidade, e a mesma recompensa lhes é atribuída? A mesma, na verdade. Pois, as possibilidades diferem, mas a caridade é igual.



§ 11
Eles, portanto, interrogam; quanto a vós, ponderai o que sois. Eis que nos foi dito:

Iremos à casa do Senhor”.

Certamente alegramo-nos com o que nos foi dito:

iremos à casa do Senhor”.

Verifiquemos, então, se vamos. Pois, não vamos com os pés, mas com os afetos. Vede se vamos; cada qual interrogue-se a si mesmo como procede para com o pobre que vive santamente, para com o irmão indigente, para com o mendigo em penúria; verifique se não tem um coração mesquinho. Por que os tronos se assentarão para julgar; eles devem te interrogar e querem encontrar em ti o que trará paz a Jerusalém. E como interrogam? Como tronos de Deus. Deus interroga. Se algo fica oculto a Deus, igualmente poderá escapar àqueles tronos perscrutadores.

Interrogai o que trará a paz a Jerusalém”.

Que é que trará a paz a Jerusalém? “E a abundância aos que te amam”.

O salmista dirige-se agora à própria Jerusalém. Há abundância para aqueles que a amam. Abundância que brotou da penúria. Aqui necessitados, ali fartos; aqui fracos, ali firmes; aqui pobres, alí ricos. Por que se tornaram ricos? Porque deram aqui na terra o que receberam de maneira temporária de Deus, e receberão lá a retribuição eterna da parte de Deus. Aqui, meus irmãos, até os ricos são pobres. É bom que o rico se reconheça como pobre. Se ele se considera plenamente enriquecido, está com um tumor; não é plenitude. Reconheça sua penúria a fim de ficar repleto. O que possui? Ouro. E o que ainda não tem? A vida eterna. Verifique o que tem e o que não tem. Irmãos, dê de suas posses, a fim de receber aquilo de que carece; compre com o que tem aquilo que ainda não tem.

E a abundância aos que te amam”.



§ 12
7 “Haja paz em tua fortaleza”.

Ó Jerusalém! Ó cidade construída como cidade, que participa in idipsum, haja paz em tua fortaleza, haja paz em tua caridade; porque tua força é a tua caridade. Escuta o Cântico dos cân-ticos:

O amor é forte, é como a morte(Ct 8,6).

Palavra magnífica, irmãos:

O amor é forte, é como a morte”.

Impossível exprimir de modo mais magnífico a força da caridade do que dizer:

O amor é forte, é como a morte”.

Pois, quem resiste à morte, irmãos? V. Caridade dê-me atenção. Resiste-se ao fogo, à água, à espada; resiste-se aos potentados, aos reis; somente à morte, quando ela chega, quem resiste? Nada de mais forte. Por isso, a caridade é comparada a sua força e se diz:

O amor é forte, é como a morte”.

Considerando que a caridade mata o que fomos, a fim de nos tornarmos o que não éramos, o amor opera em nós uma espécie de morte. Assim morrera aquele que declarava:

O mundo está crucificado para mim e eu para o mundo(Gl 6,14).

Desta morte morreram os destinatários destas palavras do Apóstolo:

Mor-restes e vossa vida está escondida com Cristo em Deus(Cl 3,3).

O amor é forte, é como a morte”.

Se, portanto, é válido, é forte, é valoroso, é a própria força, que orienta os fracos por meio dos firmes, a terra pelo céu, os povos pelos tronos, então, “haja paz em tua fortaleza”, haja paz em teu amor. E por esta virtude, por este amor, por esta paz, “haja abundância em tuas torres”, isto é, em tuas alturas. Poucos se assentarão no dia do juízo; mas muitos, colocados à direita, constituirão o povo daquela cidade. Muitos pertencerão a cada um dos mais ilustres, que os receberão nos tabernáculos eternos; e haverá “abundância em tuas torres”.

A plenitude das delícias, porém, e a abundância das riquezas será o próprio Deus, o próprio idipsum. Ele idipsum, por quem a cidade participará in idipsum. Esta abundância será também a nossa. Mas, como? Através da caridade, isto é, da virtude. Em quem existe a caridade, irmãos? Naquele que não procura os próprios interesses nesta vida (Fl 2,4.21).

Escuta como fala o Apóstolo que possui a caridade:

Assim como eu mesmo me esforço por agradar a todos em todas as coisas”, igualmente agradai, também vós. Onde fica então o que disseste:

Se eu quisesse ainda agradar os homens, não seria servo de Cristo”? (Gl 1,10).

E agora dizes que agradas, agora exortas a que eles também agradem? Mas não tinha isso como finalidade. Ninguém procure agradar por sua própria causa e sim devido à caridade. Quem busca a própria glória, não pensa na salvação dos outros. Por isso, disse o Apóstolo:

Assim como eu mesmo me esforço por agradar a todos em todas as coisas, não procurando os meus interesses pessoais, mas os do maior número, a fim de que sejam salvos(1 Cor 10,32.33).



§ 13
8 Por isso, aqui trata o salmista da caridade:

Por amor de meus irmãos e meus amigos, pedi por ti a paz, ó Jerusalém, cidade que participa in idipsum. Eu, nesta vida e nesta terra, eu, pobre, peregrino em gemidos, que ainda não gozo de tua paz, mas a anuncio, não a anuncio por minha causa, como os hereges que, buscando sua própria glória, dizem: A paz esteja convosco, e não têm a paz que anunciam aos povos, porque se tivessem a paz, não romperiam a unidade, eu, porém, “pedi por ti a paz”.

Mas, por que razão? “Por amor de meus irmãos e meus amigos”, não por minha honra, não por meu dinheiro, não por minha vida; “pois, para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro. Pedi a paz por ti, por amor de meus irmãos e meus amigos”.

Com efeito, meu desejo é partir e ir estar com Cristo”.

Quem assim pregava a seus amigos e a seus irmãos, disse:

Mas o permanecer na carne é mais necessário por vossa causa(Fl 1,21.23.24).

Por amor de meus irmãos e meus amigos, pedi por ti a paz”.



§ 14
9 “Por amor da casa do Senhor meu Deus, desejo-te todos os bens”.

Não procurei os bens por minha causa, senão não os buscaria para ti, mas para mim; portanto, nem eu os teria, porque não os buscaria para ti, “mas por amor da casa do meu Deus”, por amor da Igreja, por amor dos santos, dos peregrinos, dos pobres, para que subam, quando lhes dizemos:

Iremos à casa do Senhor. Por amor da casa do Senhor meu Deus, desejo-te todos os bens”.

Foi um sermão prolixo, mas necessário, meus irmãos; triturai-o, comei-o, bebei-o. Fortalecei-vos, correi e apreendei. 1 Cf. Com. s/salmo 38,2; 119,1-3.