ORAÇÃO ⁜ SALMO DA BÍBLIA № 111 | ||
§ 111:1 | Ł Louvai ao Senhor. De todo o coração darei graças ao Senhor, no concílio dos retos e na congregação. | |
§ 111:2 | ʛ Grandes são as obras do Senhor, e para serem estudadas por todos os que nelas se comprazem. | |
§ 111:3 | ʛ Glória e majestade há em sua obra; e a sua justiça permanece para sempre. | |
§ 111:4 | ⱻ Ele fez memoráveis as suas maravilhas; compassivo e misericordioso é o Senhor. | |
§ 111:5 | Ɗ Dá mantimento aos que o temem; lembra-se sempre do seu pacto. | |
§ 111:6 | ɱ Mostrou ao seu povo o poder das suas obras, dando-lhe a herança das nações. | |
§ 111:7 | Ɑ As obras das suas mãos são verdade e justiça; fiéis são todos os seus preceitos; | |
§ 111:8 | ᵮ firmados estão para todo o sempre; são feitos em verdade e retidão. | |
§ 111:9 | ⱻ Enviou ao seu povo a redenção; ordenou para sempre o seu pacto; santo e tremendo é o seu nome. | |
§ 111:10 | Ꝋ O temor do Senhor é o princípio da sabedoria; têm bom entendimento todos os que cumprem os seus preceitos; o seu louvor subsiste para sempre. | |
O SALMO 111 | ||
SERMÃO AO POVO 💬 | ||
§ 1 | 1 Creio, irmãos, que prestastes atenção ao título deste salmo e o guardastes na memória. É o seguinte: “Regresso de Ageu e de Zacarias”. Esses profetas ainda não existiam quando este salmo foi cantado. Pois, entre o tempo de Davi e o exílio do povo de Israel na Babilônia, contam-se catorze gerações, como atesta a Sagrada Escritura, principalmente o evangelista Mateus (cf Mt 1,17). A restauração do templo destruído, segundo a profecia do santo profeta Jeremias (cf Jr 25,12; 29,10), era esperada após setenta anos de cativeiro. Ao se completarem esses anos, sob Dario, rei da Babilônia, ficaram cheios do Espírito Santo esses dois profetas, Ageu e Zacarias. E ambos, com um ano de diferença, começaram a profetizar relativamente à restauração do templo, conforme tanto tempo antes fora predito (cf Esd 1,5; Ag 1; Zc 1). Mas todo aquele que materialmente fixa o olhar do coração nos fatos, e não vai até a graça do sentido espiritual, detém-se com o pensamento nas pedras do templo, com as quais se eleva pelas mãos dos homens a construção visível. Mas ele mesmo não se torna uma pedra viva, adaptada e conveniente àquele templo, que o Senhor antes de tudo comparou a seu corpo, ao dizer: “Destruí este templo, e em três dias eu o levantarei” (Jo 2,19). O corpo do Senhor total é a santa Igreja. A Cabeça subiu ao céu. Principalmente o Senhor é a pedra viva, a pedra angular, a que se refere são Pedro: “Chegai-vos a ele, a pedra viva, rejeitada, é verdade, pelos homens, mas diante de Deus eleita e preciosa. Do mesmo modo, também vós, como pedras vivas, constituí-vos em um edifício espiritual, um sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais aceitáveis a Deus por Jesus Cristo. Com efeito, nas Escrituras se lê: Eis que ponho em Sião uma pedra angular, eleita e preciosa; quem nela crê não será confundido” (1Pd 2,4-6). Conseqüentemente, a fim de que alguém se transforme em pedra viva, adaptada a tal edifício, entenda espiritualmente a restauração do templo, em ruínas causadas anteriormente por Adão, e a reparação do povo novo segundo o homem novo e celeste. Assim como trouxemos a imagem do homem terrestre, assim também tenhamos a imagem do homem celeste (cf 1Cor 15,49), de tal sorte que possamos, após todas as épocas deste mundo, como se fosse após setenta anos, número místico que marca a perfeição, e após o cativeiro de uma longínqua peregrinação, sermos consolidados pela eterna imortalidade e não entrarmos numa construção destinada à ruína. Cosiderai que a Jerusalém espiritual, de fato, é mais vossa do que dos judeus, conforme a palavra do Apóstolo: “Já não sois estrangeiros e adventícios, mas concidadãos dos santos e membros da família de Deus. Estais edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, do qual é Cristo Jesus a pedra angular. Nele bem articulado, todo o edifício se ergue em santuário sagrado, no Senhor, e vós, também, nele sois coedificados para serdes uma habitação de Deus, no Espírito” (Ef 2,19-22). É este o templo de Deus, ao qual pertence o sacramento das profecias de Ageu e de Zacarias. O mesmo Apóstolo ainda diz: “Pois o templo de Deus é santo e esse templo sois vós” (1 Cor 3,17). Todo aquele, portanto, que se converte da ruinosa queda deste mundo à coedificação desta obra e à esperança de sua santa e firme inclusão, como pedra viva, no edifício, entende o título do salmo, entende o regresso de Ageu e Zacarias. Cante, portanto, o que segue, não tanto com a voz quanto com a vida. Será, então, a perfeição do edifício, aquela inefável paz da sabedoria, cujo início é o temor do Senhor (cf Pr 1,7); comece, pois, daí aquele a quem coedifica este regresso. | |
§ 2 | “Feliz o homem que teme o Senhor e muito se com-praz em seus mandamentos”. Verá Deus, o único que julga com veracidade e misericórdia quanto o salmista se adianta no caminho de seus mandamentos, porque é uma tentação a vida humana sobre a terra (Jó 7,1), conforme declara o santo varão Jó. Ainda está escrito: “Um corpo corruptível pesa sobre a alma e — tenda de argila — oprime a mente pensativa” (Sb 9,15). Mas quem nos julga é o Senhor; por conseguinte, não devemos julgar prematuramente, antes que venha o Senhor. Ele porá às claras o que está oculto nas trevas e manifestará os desígnios dos corações. Então cada um receberá de Deus o louvor que lhe for devido (1 Cor 4,4.5). Veja, portanto, cada um quanto se adiantou nos mandamentos de Deus; no entanto muito se compraz quem amar a paz daquela edificação; não deve desanimar porque “muito se compraz em seus mandamentos”, e há paz na terra para os homens que Deus ama (cf Lc 2,14). | |
§ 3 | 2.3 Daí: “poderosa na terra será a sua descendência”. O Apóstolo atesta que são sementes da futura messe as obras de misericórdia, dizendo: “Não desanimemos na prática do bem, pois, se não desfalecermos, a seu tempo colheremos” (Gl 6,9), e ainda: “Sabei que quem semeia com parcimônia, com parcimônia também colherá” (2 Cor 9,6). Que pode haver de maior, meus irmãos, que não somente Zaqueu compre o reino dos céus com metade de seus bens, mas ainda a viúva com duas moedinhas, e ambos lá possuam o mesmo? (cf Lc 19,8; Mc 12,42). Que há de maior do que custar o mesmo reino todos os tesouros para um rico e um copo de água fria para um pobre? Existem os que o fazem, à busca de bens terrenos, esperando do Senhor uma recompensa na terra, ou desejando agradar aos homens; mas “abençoada será a geração dos justos”, isto é, as obras dos retos de coração, para os quais é bom o Deus de Israel. Coração reto consiste em não resistir ao Pai quando corrige, e acreditar nele quando faz promessas. Não o têm aqueles cujos pés vacilam, cujos passos por um triz resvalam, como se canta em outro salmo, ao terem inveja dos maus, observando a paz dos pecadores e pensando que são inúteis suas obras, porque não lhes é dado um prêmio perecível (cf Sl 72,1-14). Ao contrário, o homem que teme o Senhor, e se adapta ao santo templo de Deus, pela conversão de um coração reto, não procura a glória humana, nem ambiciona riquezas terrenas; e no entanto: “Glórias e riquezas terá em sua casa”. Com efeito, sua casa é seu coração, onde, louvando-o Deus, há de habitar de forma mais opulenta com a esperança da vida eterna do que, recebendo a adulação dos homens, há de morar sob tetos e artesanais recobertos de mármore, mas com medo da morte eterna. “A justiça desse perdura pelos séculos dos séculos”: é a sua glória, sua riqueza. A púrpura, o linho fino, os banquetes esplêndidos do outro, vêm e passam; e ao chegar o fim, ele desejará uma gota de água na ponta do dedo, clamando com a língua a arder (cf Lc 16,19-24). | |
§ 4 | 4.9 “Para os retos de coração uma luz surgiu nas trevas”. Com razão dirigem seu coração para seu Deus, com razão andam os retos junto de seu Deus, preferindo a vontade de Deus a si mesmos, sem presumirem soberbamente coisa alguma de si mesmos. Lembram-se de que foram outrora trevas e de que agora são luz no Senhor (cf Ef 5,8). “Misericordioso, compassivo e justo é o Senhor Deus. “Apraz que seja “misericordioso e compassivo”, mas talvez atemorize porque é “justo o Senhor Deus”. Não receies desesperançado, homem feliz, que temes o Senhor e te comprazes muito em seus mandamentos; sê suave, tem compaixão e empresta. O Senhor Deus é tão justo que submeterá a juízo sem misericórdia aquele que não praticou a misericórdia (cf Tg 2,13). Todavia, é “suave o homem que se compadece e empresta”. Deus não o rejeita de sua boca, como sendo de sabor desagradável. “Perdoai, e vos será perdoado. Dai, e vos será dado” (Lc 6,37.38). En-quanto perdoas para te ser perdoado, tu te compadeces; enquanto dás para que te seja dado, emprestas. Embora se inclua geralmente sob o nome de misericórdia todo socorro a um necessitado, há uma diferença quando não tens despesa pecuniária, nem trabalho corporal, mas perdoas quem pecou contra ti, e compras gratuitamente o perdão dos pecados. Parece-me que esses dois serviços de bondade, o de perdoar os pecados e de prestar benefícios, conforme citamos do evangelho: “Perdoai, e vos será perdoado, dai, e vos será dado”, acham-se distintamente neste versículo: “suave o homem que se compadece e empresta”. Não sejamos negligentes nisto, irmãos. Procura a sua glória quem deseja se vingar; mas atende ao que foi escrito: “Mais vale o que vence a cólera do que o conquistador de uma cidade” (Pr 16,32). Ambiciona riquezas quem não quer dar aos pobres; atende ao que foi escrito: “Terás um tesouro nos céus” (Mt 19,21). Não serás inglório ao perdoares, porque é mais louvável triunfar, vencendo a ira; nem o serás dando ao pobre, porque é mais seguro possuir um tesouro celeste. Este versículo brota daquele mais acima: “Glória e riquezas terá em sua casa”. | |
§ 5 | Quem assim age, “disporá seus discursos no juízo”. Suas ações são os discursos que o defenderão no julgamento; este não será sem misericórdia, porque ele mesmo praticou a misericórdia. “Porque jamais há de vacilar” aquele que estiver separado à direita e que ouvirá: “Vinde, benditos de meu Pai, recebei por herança o reino preparado para vós desde a criação do mundo”. Ali são relembradas apenas as obras de misericórdia. Ouvirá, portanto: “Vinde, benditos de meu Pai, porque a geração dos retos será abençoada” (Sl 112,2). Assim, “a lembrança do justo será eterna. Não receará más notícias” como aquela, que ouvirá, dirigida aos da esquerda: “Apartai-vos de mim, ide para o fogo eterno preparado para o diabo e para seus anjos” (Mt 25,34-41). | |
§ 6 | Portanto, os que na terra não procuram seus interesses, mas os de Jesus Cristo, suportam os trabalhos com toda paciência, e esperam confiantes a realização das promessas: “Seu coração está preparado, confiante no Senhor”. Não fica alquebrado diante das tentações: “Fortalecido está o seu coração, não se abalará, até ver confundidos os seus inimigos”. Esses inimigos queriam ver na terra bens, enquanto lhes eram prometidos os bens invisíveis, e diziam: “Quem nos dará a felicidade”? (Sl 4,7). Fortaleça-se, portanto, o nosso coração, não nos abalemos, até vermos confundidos nossos inimigos. Eles quiseram ver bens humanos na terra dos que morrem; nós acreditamos que veremos os bens do Senhor na terra dos vivos (cf Sl 26,13). | |
§ 7 | É de fato grande coisa ter o coração fortalecido e não se abalar, enquanto os que amam os bens visíveis se alegram, injuriando quem espera o que não vê. “Não se abalará até ver”, também ele, não em baixo o que vêem os seus inimigos, mas no alto, acima de “seus inimigos”, o que os olhos não viram, os ouvidos não ouviram e o coração do homem não percebeu, isso que Deus preparou para aqueles que o amam (cf 1Cor 2,9). Quão grande o valor daquilo que não se vê e se compra pelo preço que cada um puder dar! Por isso, também o justo “distribuiu largamente, deu aos pobres”. Não via, mas comprava. Todavia, guardava o tesouro no céu aquele que se dignava ter fome e sede em seus pobres na terra. Não é de admirar, portanto, que “sua justiça perdure pelos séculos dos séculos”, sob a guarda daquele que criou os séculos. “Seu poder será exaltado na glória”, pois sua humildade era desprezada pelos soberbos. | |
§ 8 | 10 “O pecador verá e se irritará”. Será tardia e inútil aquela penitência. Pois ele “se irritará” contra quem mais do que contra si mesmo dizendo: “Que proveito nos trouxe o orgulho? De que nos serviu riqueza e arrogância” (Sb 5,9), quando vê ser exaltado na glória o poder daquele que distribuiu largamente e deu aos pobres? “Rangerá os dentes e se consumirá”, porque lá haverá choro e ranger de dentes. Não se cobrirá de folhas nem reverdecerá, como se faria se em tempo oportuno se arrependesse; mas ele se arrependerá quando “o desejo dos pecadores será frustrado”, sem qualquer alívio. Será frustrado o desejo dos pecadores, quando tudo passar como sombra; quando a flor murchar, tendo secado o feno. Mas, a palavra do Senhor que permanece eternamente (cf Is 40,8), assim como foi ridicularizada pela vaidade dos que falsamente eram felizes, zombará da perdição daqueles que são verdadeiramente infelizes. | |