ORAÇÃO ⁜ SALMO DA BÍBLIA № 110 | ||
§ 110:1 | Ɗ Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos por escabelo dos teus pés. | |
§ 110:2 | Ꝋ O Senhor enviará de Sião o cetro do teu poder. Domina no meio dos teus inimigos. | |
§ 110:3 | Ꝋ O teu povo apresentar-se-á voluntariamente no dia do teu poder, em trajes santos; como vindo do próprio seio da alva, será o orvalho da tua mocidade. | |
§ 110:4 | Ʝ Jurou o Senhor, e não se arrependerá: Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque. | |
§ 110:5 | Ꝋ O Senhor, à tua direita, quebrantará reis no dia da sua ira. | |
§ 110:6 | Ʝ Julgará entre as nações; enchê-las-á de cadáveres; quebrantará os cabeças por toda a terra. | |
§ 110:7 | Ꝓ Pelo caminho beberá da corrente, e prosseguirá de cabeça erguida. | |
O SALMO 110 | ||
SERMÃO 💬 | ||
§ 1 | Chegaram os dias de cantarmos Aleluia. Ficai atentos, irmãos, para apreendermos o que o Senhor nos sugere a fim de exortar-vos e alimentar a caridade, com a qual é bom aderirmos a Deus. Sede atentos, bons cantores, filhos do louvor e da glória eterna do Deus verdadeiro e incorruptível. Estai atentos, vós que sabeis cantar e sal-modiar em vossos corações ao Senhor, sempre e por tudo dando graças; e louvai a Deus: tal é o significado do Aleluia. Estes dias, de fato, chegam para passarem e passam os que virão, simbolizando o dia que não vem e passa, porque a sua chegada não foi precedida por um ontem, nem é obrigado a passar por um amanhã. Efetivamente, quando chegarmos a este dia, aderindo a ele, também nós não passaremos. Conforme se canta a Deus em outro salmo: “Felizes os que habitam em tua casa. Louvar-te-ão pelos séculos dos séculos” (Sl 83,5), será esta a ocupação dos que se entregam ao lazer, a obra dos que estão de férias, a ação dos que se acham quietos, o cuidado dos que se encontram em segurança. Como estes dias sucedem, solenemente e cheios de agradável alegria, aos dias passados da quaresma, nos quais antes da ressurreição do corpo do Senhor se representava a tristeza da vida presente, assim aquele dia que depois da ressurreição haverá para todo o corpo do Senhor, isto é, a santa Igreja, virá trazendo a perpétua felicidade, depois de excluídas todas as tribulações e dores desta vida. Esta vida, porém, exige de nós a temperança, de tal sorte que enquanto gememos acabrunhados, com labor e luta, porque não queremos ser despojados da nossa veste, mas revestir a outra por cima (cf 2Cor 5,2), abstenhamo-nos de alguns prazeres temporais. Isto é representado pelo número quarenta, número dos dias do jejum de Moisés, de Elias e do próprio Senhor. Prescrevem-nos a lei, os profetas e o próprio evangelho (que foi testemunhado pela lei e os profetas; daí vem que no monte o Salvador se transfigurou, estando no meio de ambos, Moisés e Elias) (cf Ex 34,28; 1Rs 19,8; Mt 4,2; cf Mt 17,3), que refreemos pelo jejum a temperança da nossa avidez de atrativos do mundo, que levam os homens cativos a se esquecerem de Deus enquanto a perfeição do Decálogo, como um saltério de dez cordas, é anunciada pelas quatro partes do mundo, isto é, por todo o orbe; de sorte que dez vezes quatro perfaçam o número quarenta. O número cinqüenta, porém, a contar da ressurreição do Senhor, em que cantamos o Aleluia, não significa a passagem e fim de um tempo, mas figura a eternidade feliz; porque consta de dez somado a quarenta e o denário constitui a recompensa dos fiéis que trabalham na vida presente, e que o pai de família preparou, dando-a igualmente aos primeiros e aos últimos. Ouçamos, portanto, as vozes que saem do peito do povo de Deus, repletas do louvor divino. Eis que neste salmo ressoa a voz de alguém que exulta com regozijo feliz, e prefigura o povo de Deus, isto é, o corpo de Cristo, libertado de todo mal e com o coração transbordante de amor. | |
§ 2 | 1.2 “Confessar-te-ei, Senhor, de todo o coração”. Nem sempre a confissão é relativa a pecados; mas também é louvor de Deus a oferta da confissão. A primeira chora, a segunda se alegra; uma descobre ao médico a ferida, esta dá graças pela cura. A confissão deste salmo indica alguém que não foi apenas libertado de todo mal, mas ainda foi separado de todos os malvados. E por isso, vejamos onde confessa ao Senhor de todo coração. Diz ele: “No conselho e na assembléia dos justos”. Creio que se sentarão em doze tronos para julgar as doze tribos de Israel (cf Mt 19,28). Entre eles, já não há iníquo, não se toleram furtos de nenhum Judas, nenhum Simão mago é batizado nem procura comprar o dom do Espírito que pensa vender (cf At 8,13.18.19), nenhum Alexandre, caldeireiro, dá provas de muita maldade (cf 2Tm 4,14), nenhum falso irmão se insinua sob pele de ovelha. Entre esta espécie de gente necessariamente geme a Igreja agora e deverá excluí-la quando todos os justos forem congregados. Estas são as “grandes obras do Senhor, apropriadas a todas as suas vontades”, pelas quais a misericórdia não abandona o pecador que se confessa, mas não deixa impune iniqüidade alguma, e castiga todo filho que ela acolhe (cf Hb 12,6). Mas, se o justo com dificuldade consegue salvar-se, em que situação ficarão o ímpio e o pecador? (1Pd 4,18). Escolha o homem o que quer, mas as obras do Senhor não são estabelecidas de tal modo que a criatura dotada de livre-arbítrio supere a vontade do Criador, mesmo se agir contra sua vontade. Deus não quer que peques, pois o proíbe; no entanto se pecares, não penses que o homem fez o que quis, e sucedeu a Deus o que não quis. Pois, como ele quer que o homem não peque, quer poupar o pecador para que se converta e viva, quer por fim punir aquele que persevera no pecado, de tal modo que o contumaz não escape ao poder da justiça. Assim, seja o que for que escolhas, o Onipotente não deixará de cumprir sua vontade a teu respeito. Pois, “grandes são as obras do Senhor, apropriadas a todas as suas vontades”. | |
§ 3 | 3 “Confissão e magnificência são os seus feitos”. Que há de mais magnífico do que justificar o ímpio? Mas, talvez a obra humana preceda esta magnificência de Deus, de modo que ao confessar o homem seu pecado, mereça ser justificado. De fato, o publicano desceu do templo mais justificado do que o fariseu, porque “não ousava sequer levantar os olhos para o céu, mas batia no peito, dizendo: Meu Deus, tem piedade de mim, pecador!” A magnificência do Senhor é esta: a justificação do pecador, porque “todo o que se exalta será humilhado, e quem se humilha será exaltado” (Lc 18,13.14). Tal a magnificência do Senhor; porque aquele que foi mais perdoado, mais ama (cf Lc 7,42-28). Tal a magnificência do Senhor; pois “onde avultou o pecado, a graça superabundou” (Rm 5,20). Mas talvez devido às obras. Não, diz o Apóstolo, “não vem das obras, para que ninguém se encha de orgulho. Pois somos criaturas dele, criados em Cristo para as boas obras” (Ef 2,9.10). O homem só pratica a justiça depois de justificado; crendo “naquele que justifica o ímpio” (Rm 4,5) começa pela fé, de tal forma que as boas obras indicam, não precedendo o que ele mereceu, mas seguindo o que ele recebeu. De onde então vem a confissão? De fato, não é ainda obra de justiça, mas reprovação do delito; seja como for, nem desta te glories, ó homem, porém “aquele que se gloria, se glorie no Senhor” (1 Cor 1,31). “Que é que possuis que não tenhas recebido?” (1 Cor 4,7). Não somente, portanto, a magnificência que justifica o ímpio, mas ainda “confissão e magnificência são os seus feitos. Que diremos então? Porque ele faz misericórdia a quem quer e endurece a quem ele quer. Há injustiça por parte de Deus? De modo algum” (Rm 9,14.18). Pois, “permanece pelos séculos dos séculos a sua justiça”. Quem és tu, ó homem deste século, para discutires com Deus? (Rm 9,20). | |
§ 4 | 4.5 “Deixou lembrança de suas maravilhas”: a um humilha e a outro exalta. “Deixou lembrança de suas maravilhas”. Ele reserva oportunamente prodígios extraordinários, para que a fraqueza humana, atenta às novidades, se recorde, apesar de serem maiores os seus milagres cotidianos. Cria por toda a terra tantas árvores e ninguém se admira; seca uma com sua palavra e o coração dos mortais fica estupefacto (cf Mt 21,19.20); “mas deixou lembrança de suas maravilhas”. Os corações atentos se apegarão mais aos milagres que não terão perdido o valor para eles por causa de sua assiduidade. | |
§ 5 | Para que serviram os milagres, a não ser para incutirem temor? O que adiantaria, porém, o temor se o “Senhor, miseriocordioso e clemente”, não sustentasse “os que o temem?” Desceu o pão do céu (cf Jo 6,27.51), alimento incorruptível, dado a quem nada merecia. Pois Cristo morreu pelos ímpios (cf Rm 5,6). Ninguém daria tal alimento, a não ser o Senhor misericordioso e clemente. Se deu tanto nesta vida, se o Verbo feito carne acolheu o pecador para justificá-lo, que não receberá no futuro século o que for glorificado? Pois, “lembrar-se-á eternamente de sua aliança”. Não deu tudo quem deu um penhor. | |
§ 6 | 6.9 “Manifestará a seu povo o poder de suas obras”. Não se contristem os israelitas santos que abandonaram tudo o que tinham e o seguiram; não se contristem dizendo: “Quem poderá então salvar-se?” Porque “é mais fácil um camelo entrar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino de Deus” (Mt 19,24-26). Anuncia-lhes o poder de suas obras; de fato, ao homem é difícil, mas a Deus é fácil. “Dando-lhes a herança das nações”. Chegou até os gentios, e foi ordenado aos ricos deste mundo que não fossem orgulhosos, nem pusessem sua esperança na instabilidade da riqueza, mas em Deus (cf 1Tm 6,17), para o qual é fácil o que é difícil para os homens. Assim, pois, muitos foram chamados, assim foi transmitida a herança aos gentios, assim sucedeu que muitos que não deixaram tudo o que tinham nesta vida para segui-lo, desprezassem até a própria vida pela confissão de seu nome; e humilhando-se como camelos para carregar o peso das tribulações, entrassem pelo buraco da agulha, através das angústias pungentes do sofrimento. Fez isso aquele para o qual tudo é possível. | |
§ 7 | “Verdadeiras e justas são as obras de suas mãos”. Seja mantida a verdade pelos juízes aqui na terra. São julgados aqui os mártires, e serão conduzidos ao juízo, onde julgarão não somente os que os julgaram, mas até os anjos, contra os quais lutaram, mesmo quando pareciam ser julgados pelos homens (cf 1Cor 6,3). Não nos separe de Cristo a tribulação, a angústia, a fome, a nudez, a espada (cf Rm 8,35). “Imutáveis são todos os seus mandamentos”. Ele não falha; apresenta o que prometeu. Todavia, o que prometeu não deve ser esperado aqui, aguardado aqui. Mas, “confirmados pelos séculos dos séculos e instituídos com verdade e eqüidade”. É verdadeiro e justo que aqui se trabalhe, para se descansar no céu, porque ele “enviou libertação ao seu povo”. De onde são redimidos, senão do cativeiro desta peregrinação? Não se procure, portanto, repouso, a não ser na celeste pátria. | |
§ 8 | Deus deu aos isralitas carnais a Jerusalém terrena, que “é escrava com seus filhos”; mas trata-se do Antigo Testamento, pertencente ao homem velho. Os que lá perceberam a figura, também então foram herdeiros do Novo Testamento; porque “a Jerusalém do alto é livre, e esta é a nossa mãe” (Gl 4,25.26), eterna nos céus. É comprovado que o Antigo Testamento prometeu bens transitórios: “Estabeleceu para sempre o seu testamento”. Mas qual é ele, a não ser o novo? Se quiseres ser herdeiro deste testamento, não te iludas, nem penses carnalmente na terra que mana leite e mel, nem em sítios amenos, nem em hortos frutíferos e resguardados; não planejes conseguir tais coisas quais os olhos dos avarentos costumam ambicionar. Como a avareza é a raiz de todos os males (cf 1Tm 6,10), deve ser destruída para que aqui na terra termine, e não prolongada para ser saciada no céu. Em primeiro lugar, foge dos castigos, evita a geena; antes de desejares ver o Deus das promessas, acautela-te do Deus que ameaça. Pois, “santo e terrível é o seu nome”. | |
§ 9 | 10 Em substituição dos prazeres todos deste mundo que experimentaste, ou podes aumentar e multiplicar, ambiciona a sabedoria, mãe das delícias imortais; mas: “O começo da sabedoria é o temor do Senhor”. Ela deleitará, sem dúvida deleitará inefavelmente com os amplexos castos e eternos da verdade; contudo, primeiro é preciso que teus pecados sejam perdoados antes de pedires recompensa. Por conseguinte, “o começo da sabedoria é o temor do Senhor. Bom é o intelecto”. Quem o nega? Mas entender e não praticar é perigoso. “Bom”, portanto, “para os que praticam”. Não se axalta pela soberba. Se o temor é para alguém o começo da sabedoria, “seu louvor perdura pelos séculos dos séculos”. Tal será o prêmio, o fim, a permanência e o trono perpétuos. Assim todos os mandamentos se demonstrarão apropriados, confirmados pelos séculos dos séculos. Os mandamentos eternos são a herança do Novo Testamento. “Uma só coisa pedi ao Senhor, e a procurarei. Habitar na casa do Senhor todos os dias de minha vida” (Sl 26,4). Felizes os que habitam em tua casa. Louvar-te-ão pelos séculos dos séculos (Sl 83,5), porque “seu louvor perdura pelos séculos dos séculos”. | |